0 O DIA EM QUE SURFEI NA MINHA ONDA DE AZAR

    São 5:40 da manhã.Minha cabeça lateja de tanta dor, meu corpo está suado pela grande quantidade de cobertas colocadas sobre mim na intenção de melhorar minha temperatura devido a gripe ( que sempre surge no tempo frio) e afeta meu sistema imunológico tão fraco.Não aguento mais rolar de um lado a outro da cama, e é melhor parar antes que acorde meu irmão na cama do lado. Decidi me sentar um pouco, afastando os cobertores encostei na cabeceira da cama bastante aliviado em sentir a brisa fria que vinha da janela tocar minha pele. Minha cabeça doía um pouco, e para distrair a mente peguei o celular na mesinha do lado e me assustei com as 24 mensagens da garota que eu gosto. Rapidamente abri pensando ser algo fofo e que logo me animaria, mas gostaria de nunca ter feito aquilo... Duas dúzias de recados que se resumiam em "Não é você, sou eu." e "Acho melhor dar um tempo."   Doeu, doeu muito. Fiquei parado e tudo que sentia se espalhou para o resto do corpo... A dor de cabeça se intensificou com o monte de lembranças de momentos felizes que obviamente foram mentiras que me enganaram perfeitamente, e essa dor desceu para aquele famoso órgão que bombeia meu sangue. Tudo esfriou por um instante e voltei para as cobertas como se fossem me proteger dessa madrugada cheia de surpresas ruins.Fiquei pensando naquilo e a minha ficha não caia, foi necessário ler e reler e ler mais uma vez e torcer para que seja um pesadelo, mas não era.Precisava ser forte, esquecer meu mix de raiva e decepção e dar uma resposta inteligente.Minha vontade? Mandar tomar em lugares impróprios, contratar um assassino profissional, ou alguém que a sequestre para mantê-la em cativeiro e obrigá-la a ser minha pra sempre, mas infelizmente isso não seria a resposta inteligente que procurava. O sono já tinha me largado (Até você,sono?Sacanagem...) e pensei que seria melhor... Mentira, não pensei nada e sai falando um monte de bobagem, mas que eram verdades vindas da minha cabeça. Assim que terminei fiz tudo que podia para não ver um único rastro daquela que já chamei de "meu amor". Então colei meu corpo no travesseiro, fechei os olhos e deixei que a emoção me levasse para onde ela quisesse.
    Acontece que esse dia era na minha vida, e na minha vida existem dias que não vieram para dar certo. Após muito pensar em quanto fui iludido por um sorriso tão doce, adormeci jogado de uma maneira esquisita na cama, não acordei com o despertador das 7:00, e nem com o de 7:30 e o de 7:45 não senti nem vibrar.  As mãos fortes de meu pai e sua voz grossa que diziam o quanto estava atrasado me acordaram e percebi que minha aula começava dali a 5 minutos, então acho que chegarei atrasado... Pulei da cama, e enquanto me vestia correndo e tropeçando na barra da calça percebi que meu rosto estava inchado e que tinha vestido o uniforme ao avesso, nem liguei.Coloquei a blusa de frio para que ninguém visse, calcei os tênis com meias diferentes, passei uma água no cabelo, outra na boca, perfume, peguei um pão que estava na mesa e fui correndo para o ponto de ônibus e pensando em que desculpa dar para a diretora quando chegasse. Estou em uma situação de vida tão triste que nem o ônibus me quis, mal cheguei no ponto e ele fugiu de mim. Sentei arrasado e foi a partir daquele momento que descansei a cabeça da loucura de acordar atrasado e a minha mente gritou no meu subconsciente: Ô queeridooo, tô passando só pra te lembrar que você levou um fora,tá? Obrigada mente, deixa eu encostar aqui no banco do ponto e chorar até o próximo busão chegar. Não demorou muito, mas quando assustei com o barulho da chegada do ônibus deixei que meu pão caísse e lá se foi meu café da manhã... A partir daí o dia só foi piorando. Agarrei na roleta, sentei do lado de um fiel que cantava em alto e bom som as músicas de Deus, a janela do ônibus virou amiguinha dos meus pensamentos ruins e as duas me acompanharam até a chegada na escola. Tropecei enquanto entrava, caí aos pés do porteiro e da secretária que enquanto riam nem perceberam que eu estava entrando 45min depois do início das aulas e por minha sorte a diretora não estava, então logo entrei na sala e avistei as caras assustadas com a porta que rangeu e deixou bem clara a minha chegada. Dei um sorriso frouxo, vi que meus amigos estavam de pé na frente e logo um deles me gritou: 
   - Graças a Deus que tú chegou moleque, é a nossa vez de apresentar o trabalho.
Meus olhos se arregalaram, ou pelo menos tentaram pelo excesso de remela mal limpada.
  -Que trabalho??- eu disse.
 -Ora, não se finja de bobo que o Bil já tá começando a falar.- e então jogou minha mochila na carteira e me empurrou para a frente.
  Matéria vai, matéria vem, eu viajava no movimento do ventilador até chegou minha hora de falar.
  Os meninos me puxaram para o lado do quadro que mostrava o slide com o título "A cultura indiana". Olhei para sala, a professora me encarava e eu não sabia o que falar. A sala começou a rir e minha fala foi um monte de "indianos são legais" "aí aí" e para terminar com chave de ouro: "vacas são sagradas." Quando a apresentação acabou, meu colega virou pra mim e perguntou " Cara você tá bem?" Nunca tinha percebido o quanto aquela pergunta era reflexiva, então sentei na carteira, encostei a cabeça na parede e respondi pra mim mesmo: Não, eu não estou bem.E ninguém precisa saber disso.
   O sinal do intervalo toca e por um momento me sinto uma criancinha indefesa que precisa da mãe para se proteger da pior coisa do mundo: Ver a ex na melhor enquanto você chegou no fundo do poço, cavou mais um pouquinho e fez morada por lá.
    Nunca fui um bom jogador, mas durante doze minutos driblei que topasse com ela no pátio da escola perfeitamente. Meus olhos não obedeciam as jogadas, mas ok, olhos são desobedientes. Agora faltavam três minutos e eu venceria a jogada. Já me sentia melhor quando puft! A menina brotou do meu lado, sorrindo e esperando que eu sorrisse de volta. Dei um sorriso bem frouxo e para disfarçar minha vontade de abraçá-la, decidi ocupar minha mão abrindo o fecho da blusa.
   - Acho que alguém vestiu a blusa errada,em? - ela disse e subiu.
Então lembrei da confusão de manhã e me senti envergonhado, humilhado por aquela figura tão doce.Como eu queria meus cobertores e minha mãe comigo...
    O resto do dia me senti a figura mais vulnerável, e um vazio enorme me domava.
    Até chegar em casa topei com milhares de momentos constrangedores que não precisariam ser contados, Só queria me matar deitar e ficar ali por uns meses talvez. Mas calma aí que tudo piora, ao abrir a casa notei com meu boletim pendurado na geladeira e marcado na média perdida em português e acompanhada com o bilhete da minha mãe: Queria que você lavasse a louça, mas percebo que precisa URGENTEMENTE  estudar.Beijos.Mamãe.
     Que loucura a minha vida... Nada melhor do que meu antialérgico que me faz dormir para dar uma relaxada. Tomei uma dose que talvez seja perigosa, mas dormi tão rápido que nem pensei em nada...
     Acordei assustado, meu celular estava descarregado, os relógios de casa estavam parados todos na mesma hora, e a água fria do chuveiro me confirmou que a energia tinha acabado. Eu não sabia que horas eram, mas sabia que 17:00 tinha aula de violão com o amigo da minha mãe. O dia ainda estava claro, então não deveria ser muito tarde, Decidi que contaria com a sorte e sairia de casa agora, "antes chegar tarde do que atrasado", diz sempre meu pai. Tranquei a casa e fui correndo para o ponto, o ônibus estava parado e corri para pegá-lo. Quando entrei no ônibus fugi de sentar na janela e decidi  ficar em pé. Não adiantou muita coisa e aquela sensação vazia de perder quem você ama me domou mais uma vez. Eu precisava sair dessa, não rola viver bem assim.
    Estava ali pensando em mil maneiras de sair do meu abrigo no poço quando percebo que peguei o ônibus errado e fui parar perto do parque da cidade. Em um impulso idiota, dei sinal e me vi na obrigação de descer. Me senti o cara mais burro dali, não sabia que horas eram e nem como voltar pra casa direito. Entrei no parque atrás de uma alma conhecida e por sorte avistei meus amigos que se assustaram ao me ver lá mas logo me chamaram para uma partida de vôlei. Encarei aquilo tudo, dane-se a aula e as horas! Jogamos por muito tempo e nem me lembrei que tinha um coração partido. Voltamos rindo dos tombos e da minha estúpida apresentação sobre a importância da vaca indiana. Cheguei em casa e minha família me esperava sorrindo para a janta e conversando alto comentários engraçados sobre as outras famílias e eu só pude me divertir, esquecendo minhas notas baixas e os imprevistos do dia.
    Após a janta, senti que o vazio dentro de mim se fecharia a cada hora um pouquinho mais,e que existem pessoas em que seu amor por mim valia mais a pena do que aquele que perdi,É claro que em curtos espaços de tempo vou me pegar pensando nela, mas a vontade de chamá-la e perguntar como tudo vai diminui, diminui e diminui e vai diminuindo... Parei de pensar quando minha mãe me gritou para levar o lixo lá fora.
    Quando abri a porta, a filha da vizinha estava sentada no banco em frente a nossa casa e é estranho como nunca tinha reparado o quanto aquela menina é linda. Algo dentro de mim me encorajou a dizer:
-Boa Noite.-como é bom o gosto da liberdade de estar solteiro.
-Boa noite.- sua doce voz disse enquanto virava seu cabelo sedoso para me olhar.
- Seu cabelo é lindo- eu disse.
- Obrigado, gostaria de conversar mais sobre meu cabelo mas preciso entrar para casa, está tarde.- riu e se levantou.
- Sem problemas, conversamos pelo celular.Eu amo cabelos.-disse em tom de brincadeira(mas vai que cola né)
Ela estava com o portão quase fechado quando disse com um sorriso malicioso:
- 95693521, adoraria conversar.Beijos.- olhou pra mim, sorriu e fechou o portão. ( COLOOOOU!! )
   Me virei sorrindo como achei não ser possível na hora que acordei, me senti o menino mais sortudo e minha mente falava animada "Plin Plin! Salvo pelo ego!"
   
  

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